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domingo, 9 de dezembro de 2007

PRESCRIÇÃO

1. TRABALHADORES URBANOS;
2. TRABALHADORES RURAIS;
3. EMPREGADOS
DOMÉSTICOS;
4. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO
DE SERVIÇO;
5. CONCLUSÕES



I - PRESCRIÇÃO: GENERALIDADES
1) CONCEITO E FUNDAMENTOS
Para a doutrina clássica, a prescrição está intimamente ligada aos princípios de segurança,
tranqüilidade e paz social.
Caio Mário da Silva Pereira1, discorrendo sobre a matéria, assim se expressa:
``É, então, na paz social, na tranqüilidade da ordem jurídica que se deve buscar o seu verdadeiro
fundamento. O Direito exige que o devedor cumpra o obrigado e permite ao sujeito ativo valer-se da
sanção contra quem quer que vulnere o seu direito. Mas se ele se mantém inerte, por longo tempo,
deixando que se constitua uma situação contrária ao seu direito, permitir que mais tarde reviva o passado,
é deixar em perpétua incerteza a vida social. Há, pois, um interesse de ordem pública no afastamento das
incertezas em torno da existência e eficácia dos direitos, e este interesse justifica o instituto da prescrição,
em sentido genérico (...) porque o credor negligente teria permitido a criação de uma situação contrária ao
seu direito, tornando-se a exigência de cumprimento deste, um inconveniente ao sossego público,
considerado mal maior do que o sacrifício do interesse individual e tanto mais que a prolongada
inatividade induziria já à presunção de uma renúncia tácita''(grifos nossos).

Délio Maranhão2 assevera que ``funda-se a prescrição na necessidade de certeza nas relações
jurídicas. O Estado não pode tolerar a perpetuação das situações dúbias. Se o titular do direito ofendido
não age, propondo a ação para restabelecer o equilíbrio desfeito, o Estado - visando à estabilidade das
relações em sociedade - consolida a situação criada, punindo, dessa forma, àquele que negligenciou na
defesa de seu direito: dormientibus non sucurrit jus''.(grifos nossos)
Carvalho Santos3 a define como sendo ``um modo de extinguir os direitos pela perda da ação
que os assegurava, devido à inércia do credor durante um decurso de tempo determinado pela lei e que
só produz seus efeitos, em regra, quando invocada por quem dela se aproveite.''
Para Russomano4, invocando Clóvis Bevilácqua, ``a prescrição é o meio que o direito usa para
evitar que o credor possa negligenciar na cobrança da dívida, criando, assim, uma permanente situação
de mal-estar para a sociedade. A prescrição, pois, é uma regra de ordem, de harmonia e de paz, derivada
da necessidade que temos da certeza nas relações jurídicas.''
Assim, podemos dizer que a prescrição é o direito que alguém adquire, em face da inércia do
titular de uma pretensão resistida, por um período de tempo fixado em lei, de legitimamente se opor à
afirmação do direito.
2) DISTINÇÃO ENTRE PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO E PRESCRIÇÃO DO DIREITO
PRETENDIDO
Para Ugo Rocco, citado por Campos Batalha5, devemos fazer distinção entre a prescrição do
direito que se postula em juízo, da prescrição do direito de ação, posto que o objeto do direito de ação é a
prestação da atividade jurisdicional, seja ela declaratória ou constitutiva.

1 PEREIRA, Caio Mário da Silva, ``Instituições de Direito Civil'', Forense, pág. 589, citado por Ione Salin
Gonçalves e outros, in Rev. LTr 53-4/428.
2 MARANHÃO, Délio. ``Instituições de Direito do Trabalho'', 8ª ed., Rio, Freitas Bastos, 1981, vol. II, pág.
1208.
3 CARVALHO SANTOS. ``Código Civil Brasileiro Interpretado'', Rio, Freitas Bastos, citado pelo Prof.
Amauri Mascaro Nascimento em aula proferida no Curso de Pós-Graduação, USP, 27.4.89.
4 RUSSOMANO, Mozart Victor. ``Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho'', 9ª ed., Rio,
Forense, 1982, pág. 53.
5 BATALHA, Wilson de Souza Campos. ``Tratado de Direito Judiciário do Trabalho'', 2ª ed., São Paulo,
LTr, pág. 363.

Para o Mestre italiano, o direito de ação, como direito público subjetivo autônomo é independente
do indivíduo perante o Estado; à prestação jurisdicional é imprescritível.
Assim, mesmo quando se afirma que a ação está prescrita, o autor tem direito a obter a sentença
que declare a prescrição da ação.
E conclui: ``quando a ação está prescrita, o direito de ação pode ser exercitado e o autor tem
direito de obter uma sentença de mérito, que declare a inexistência do direito substancial.''
Desse modo, o que mediante a prescrição se extingue é o direito substancial postulado, incerto,
controverso ou insatisfeito de que se pleiteia a declaração ou a realização coativa aos órgãos
jurisdicionais.
3) A PRESCRIÇÃO COMO MATÉRIA DE MÉRITO
É do teor do art. 269 do CPC, que a extinção do processo quando acolhida a prescrição (inc. IV),
é feita ``com julgamento de mérito''.
É que a prescrição constitui, na essência, circunstância de fato que extingue o direito substancial.
Daí a lição de Ugo Rocco (op. cit.), in verbis:
``La prescrizione, non ha, quindi, altro effetto giuridico all' infuori di quello che può havere un
qualunque altro fatto estintivo, affermato in via di eccezione (per es.: eccezione di pagamento); esso
elimina la incertezza sulla esistenza del diritto sostanziale, in quanto è causa di estinzione di esso e rende,
quindi, certa la inesistenza del diritto sostanziale... La così detta sentenza di rigetto dell'azione per
prescrizione altro non è che una sentenza, la quale dichiaria la inesistenza del diritto sostanziale, vantato
dall'attore, estinto per prescriozione. Anche tale sentenza è, dunque, una vera e propria sentenza di
accertamento della inesistenza del diritto vantato dall'attore (accertamento negativo; acertamento del la
inesistenza della tutela accordata dal diritto obiettivo a un determinato interesse)''.
4) ELEMENTOS INTEGRANTES DA PRESCRIÇÃO
Para Câmara Leal, citado por Délio Maranhão6, os elementos que integram a prescrição são 4:
a) existência de uma ação exercitável (actio nata);
b) inércia do titular da ação pelo seu não exercício;
c) continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo;
d) ausência de algum fato ou ato, a que a lei atribua a eficácia impeditiva, suspensiva ou
interruptiva do curso prescric ional.
A propósito do quarto elemento retrocitado, há alguns casos em que há interrupção ou
suspensão da prescrição, por expressa disposição de lei. São as circunstâncias alinhadas nos arts. 168
usque 173 do Código Civil Brasileiro. São causas impedientes, suspensivas ou interruptivas da
prescrição.
d.1 - Causas impedientes: são aquelas que não permitem que o prazo prescricional comece a se
escoar. Exemplo clássico é a condição do adolescente trabalhador para os efeitos do direito do trabalho,
com previsão expressa do art. 440 da CLT;
d.2 - Causas suspensivas: são aquelas que ocorrem de repente, quando o prazo prescricional
vinha sendo contado sem nenhuma anormalidade e surge determinado fato capaz de cessar ou
suspender essa contagem de tempo. Nesses casos, o prazo até então decorrido será somado ao que
suceder ao desaparecimento do fato gerador da suspensão. Exemplo típico é do afastamento do
empregado do país a serviço da União, do Estado ou do Município;
d.3 - Causas interruptivas: são aquelas que, uma vez ocorridas, têm o condão de anular o prazo
até então decorrido, como que zerando a contagem do prazo prescricional, que somente começará a fluir,
desde o seu início, a partir do término do fato que gerou a interrupção. No Processo do Trabalho, a
simples distribuição da petição inicial interrompe a prescrição, diferentemente do cível, que pressupõe
citação válida ou, pelo menos o despacho do juiz ordenando-a. Tais causas vêm enunciadas no artigo
172 do Código Civil pátrio.
5) PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE
Há, pelo menos duas correntes diametralmente opostas sobre a sua aplicabilidade na Justiça do
Trabalho.
De um lado, o Tribunal Superior do Trabalho, que de acordo com o Enunciado da Súmula n. 114
daquela Corte, entende inaplicável o instituto ao processo do trabalho.
6 MARANHÃO, Délio. (op. cit., pág. 1.209).

Justifica sua posição no fato de que na Justiça do Trabalho vige o princípio do impulso
processual ex officio (art. 765, CLT) e nos dizeres de Câmara Leal, citado por Délio Maranhão7,
``enquanto dura a demanda, não se inicia novo prazo de prescrição''.
Outros acrescem a não exigência da representação judicial por advogado ou o jus postulandi das
partes.
A segunda corrente, originária do Supremo Tribunal Federal, consoante entendimento pacificado
na Súmula 327 daquela Excelsa Corte, defende a sua aplicabilidade no âmbito da Justiça do Trabalho.
Esta corrente vem ganhando terreno entre os doutrinadores, tendo Délio Maranhão (op. cit.)
mudado seu entendimento a respeito, a partir de 1981.
Russomano8 defende sua aplicação irrestrita na Justiça do Trabalho, entendendo que o
ajuizamento da ação trabalhista tem efeito meramente interruptivo sobre o prazo prescricional e que ``o
que mais se coaduna com a teoria geral do direito é o artigo 11 (da CLT) fixando-se o início da prescrição
contra o credor negligente no momento em que, violado seu direito, ele não reage'', valendo o preceito
para qualquer fase do processo.
Atualmente, porém, com a promulgação da CF de 1988 e em face do art. 133 da Magna Carta,
com a consagração da indispensabilidade do advogado na administração da justiça entendemos extinto o
jus postulandi das partes na Justiça do Trabalho e, ipso facto, reforçada a tese consubstanciada na
Súmula n. 327 do STF.
6) PRESCRIÇÃO PARCIAL E PRESCRIÇÃO TOTAL
A prescrição parcial é a mais comum em Direito do Trabalho.
É o caso das prestações sucessivas, tais como salário mínimo impago, horas extras trabalhadas,
etc.
A partir do dia pactuado para pagamento ou à sua míngua, a partir do 5º dia útil do mês
subseqüente ao vencido, começa a fluir o prazo prescricional para o empregado reclamar a verba
sonegada.
Sua inércia continuada acabará, ao cabo do período prescricional previsto em lei, por legitimar a
resistência oferecida pelo empregador, ou seja, a cada período implementado, incorpora-se ao patrimônio
deste o direito legítimo de resistir à pretensão de seu empregado.
Desse modo, ao exercitar o obreiro seu direito de ação contra seu ex-empregador, somente
poderá reclamar as parcelas ou diferenças das prestações sucessivas, não atingidas pelo lapso
prescricional . Se, no entanto, reclamar além desse período terá o empregador direito legítimo de resistir à
sua pretensão, através da argüição da ocorrência de prescrição.
A prescrição total, por sua vez, está intimamente ligada ao conceito de ``ato único do
empregador'', ato esse positivo e inequívoco, como por exemplo, uma transferência indesejada, a
supressão abrupta da prestação de horas extras habituais, etc.
A partir desse ato é que começa a fluir o prazo prescricional.
Assim, se o empregado que vinha prestando horas extras habitualmente há mais de dois anos, é
abruptamente impedido de continuar prestando-as, sem a respectiva incorporação de sua média em seus
vencimentos (Enunciado n. 76 do TST), desse momento começa a fluir o prazo prescricional para se
rebelar contra a atitude - única - de seu empregador e, muito embora a recusa patronal vá se repetindo
mês-a-mês, não há dúvida que o ``fato gerador'' é singular e, uma vez transcorrido o prazo legal in albis,
perde o empregado o direito de reclamar a integração que lhe era devida.
Tal entendimento, que tem variado no âmbito do TST, acaba de ser pacificado com a edição do
Enunciado n. 294 daquela Corte, que cancelou os Enunciados n. 168 e 198, excetuando apenas as
parcelas que tenham origem em preceitos legais.
7) PRESCRIÇÃO: MOMENTO DE SUA ARGÜIÇÃO
Dispõe o art. 162 do Código Civil Brasileiro, que a prescrição pode ser alegada em qualquer
instância, pela parte a quem aproveita.
Mas poderia a prescrição ser alegada na execução da sentença?
O art. 741, inc. VI, do CPC, é enfático ao admitir nos embargos do executado, apenas a alegação
de prescrição superveniente à sentença exeqüenda.
7 Idem, ibidem, pág. 1.211.
8 RUSSOMANO, Mozart Victor. ``Comentários...'' (op. cit.), págs. 59/60.

Na CLT, a mesma previsão é encontrada no § 1º, do art. 884, tratando-se, obviamente, de
prescrição intercorrente.
A resposta, então, à indagação acima há que ser sim, em termos, porquanto não se trata da
argüição da prescrição extintiva do direito, a ser feita na fase de cognição, mas outra, de natureza
diferente, fruto da inércia do exeqüente nas diligências e atos que lhe cabiam na execução.
Esse entendimento, aliás, tem sido adotado por nossos Tribunais Regionais, como em recente
julgado da lavra do Juiz José Pedro Camargo R. de Souza, reproduzido na Revista LTr 52-9/1134, cuja
ementa transcrevemos, in verbis:
``PRESCRIÇÃO - EXECUÇÃO:
- A prescrição é matéria de defesa e deve ser argüida no processo de conhecimento, atentandose
para o princípio da eventualidade.
Passada em julgado a sentença, a teor do art. 474 do CPC, reputar-se-ão deduzidas e repelidas
todas as alegações e defesas possíveis.
A prescrição é matéria de ordem pública, mas tal não suplanta o respeito à coisa julgada, cuja
índole é constitucional.
A prescrição pode ser alegada em qualquer instância detro do processo de conhecimento; a
execução não é instância, mas processo autônomo.
Quando o § 1º, do art. 884 da CLT fala em prescrição, só se pode entender como sendo aquela
superveniente à sentença.''
(TRT-15ª Reg. - AP-530/86, Ac. 2ª T. 1021/87, de 7.4.87, Rel. Juiz José Pedro Camargo R. de
Souza).
E no Recurso de Revista, cabe a argüição da prescrição, nos termos do art. 162 do Código Civil
Brasileiro?
O Tribunal Superior do Trabalho ao analisar a argüição de prescrição em ``qualquer instância'',
concluiu que esse princípio não é tão vasto quanto parece e editou o Enunciado n. 153, ex-Prejulgado n.
27, onde assentou o entendimento de que ``não se conhece de prescrição não argüida na instância
ordinária''.
É que a prescrição pode ser argüida em qualquer instância ordinária, vale dizer, na 1ª ou 2ª
Instâncias, não podendo, contudo, sê-lo em grau de recurso de revista ou mesmo de recurso
extraordinário.
De se acrescer que nos termos do art. 166 do CCB ``o juiz não pode conhecer da prescrição de
direitos patrimoniais, se não foi invocada pelas partes''.
Assim, se a prescrição não houver sido conhecida porque não alegada na fase de conhecimento,
evidente que a sentença revisanda não violou ``literal disposição de lei'', de modo a ensejar o recurso de
revista.
Somente na hipótese de haver sido argüida a prescrição e não ter sido acolhida pelo Regional,
após instado este a se manifestar em embargos declaratórios é que seria passível de servir de
fundamento a uma Revista.
8) A QUESTÃO DA PRESCRIÇÃO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988: RETROATIVIDADE OU
APLICAÇÃO IMEDIATA?
Há, com certeza, ainda, muita polêmica acerca da matéria.
Diz o § 1º, do inc. LXXVII, do art. 5º, da CF de 1988 que, verbis:
``As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata:''
Por sua vez, no mesmo art. 5º, inc. XXXVI, o Constituinte declara:
``A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, ou a coisa julgada.
O que significam essas locuções?
As definições estão na Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, art. 6º, verbis:
``§ 1º - Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se
efetuou.
§ 2º - Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa
exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida
inalterável a arbítrio de outrem.
§ 3º - Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.''
(grifos nossos)
Vários doutrinadores vêm tentando balizar o conturbado tráfego das diversas correntes de
pensamento.
Alguns têm s e posicionado a favor da retroatividade irrestrita da nova lei.
Nesta corrente, destacamos Fernando Diego Canizares, citado por Ione Salin Gonçalves9
quando afirma:
``Frente a uma norma de evidente interesse público e social que altera as situações jurídicas
previamente estabelecidas ao amparo de uma legislação anterior, deve imperar a lei nova, que sem
dúvida foi ditada tendo em conta uma nova realidade social.'' (grifos nossos)
Os próprios articulistas citados na nota 9 acima (Ione Salin Gonçalves e outros 4), todos Juízes
do Trabalho no Rio Grande do Sul, partilham dessa corrente - da retroação irrestrita da nova lei - como
norma mais benéfica ao empregado, titular de um direito fundamental, concluindo seu trabalho de forma
inequívoca e contundente, verbi s:
``Assim, deve retroagir quando tem seu prazo ampliado exatamente porque mais favorável ao
trabalhador, titular de um direito fundamental por ela restringido, aplicando-se a todas as relações de
emprego não extintas há dois anos da promulgação da nova Constituição, o que inclui as ações
pendentes de sentença, inclusive em grau de recurso, e mesmo as atingidas pela coisa julgada que ainda
estejam passíveis de ação rescisória.'' (grifos nossos)
No mesmo sentido, mas com restrição parcial quanto à coisa julgada coloca-se Márcio Túlio
Viana10, in verbis:
``Nessa linha de raciocínio, parece-me razoável concluir que o novo prazo de cinco anos, criado
pela Constituição, aplica-se até mesmo às lesões de direito ocorridas antes de outubro de 1986, desde
que não decretada a prescrição em processo judicial.
Assim, o único ``obstáculo'' à aplicação da nova regra deve ser a existência de coisa julgada.(...)''
(grifos nossos)
E invoca Caldas Pereira11 em seu socorro:
``Não podemos considerar a prescrição como uma forma de proteção ao devedor, porquanto, se
assim fosse, seria ela desprovida de qualquer sentido ético e moral, já que nada justifica a proteção do
devedor inadimplente, em detrimento do credor honesto. O benefício advindo ao devedor é simples
conseqüência da prescrição e não fundamento desta.'' (grifos nossos)
E conclui Túlio Viana:
``De fato, é a paz social - e não a do devedor - que justifica a morte da ação do credor. E se o
próprio legislador, em dado momento histórico passa a considerar que um prazo de cinco anos não
ameaça a estabibilidade social, deve ser este prazo aplicado desde logo, indistintamente resguardandose
apenas a força imutável da res judicata.'' (grifos nossos)
Mais recentemente, outro articulista, José Tôrres das Neves12, em longo artigo publicado na
Revista LTr 53-8/912, também abraça a mesma tese da retroatividade do texto constitucional, verbis:
``O prazo prescricional é um só de cinco anos, apenas não deixa de fluir, após o término do
contrato de trabalho, até dois anos. Não há dois fenômenos prescricionais distintos, um, antes, e outro,
depois, da vinculação empregatícia. Fosse assim a expressão `até' perderia qualquer sentido lógico ou
mesmo semântico.'' (grifos nossos)
E prossegue na defesa de sua tese:
``O art. 7º, XXIX, ``a'', da Carta Magna aplica-se aos processos em curso. Em primeiro lugar,
porque se reveste de natureza processual, ao regular a prescrição do direito de ação. Assim, tem
aplicação imediata; em segundo lugar, em função do seu objeto, que é a proteção dos salários, pa rcela
9 I. GONÇALVES, Ione Salin; II. GUTERRES, Jurema Reis de Oliveira; III. LEDUR, José Felipe; IV.
VARGAS, Luis Alberto de; V. FRAGA, Ricardo Carvalho. ``A prescrição trabalhista constitucional'', in Rev.
LTr 53 -4/430.
10 VIANA, Márcio Túlio. ``Prescrição: Dúvidas e Soluções'', in Rev. LTr, 53-1/72-74.
11 CALDAS PEREIRA, R. Jorge. ``O contrato de trabalho e sua alteração'', São Paulo, LTr, 1975, pág.
184.
12 NEVES, José Tôrres das. ``Prescrição no Direito do Trabalho à Luz da Nova Carta Magna'', in Rev. LTr
53-8/912-931.

de natureza alimentar. Daí a razão de sua inclusão entre os direitos inseridos no Capítulo II - Dos Direitos
Sociais, do Título II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais.
Tratando-se de Garantia Fundamental dos Trabalhadores, particularizada como direito social,
seria inconcebível a invocação do art. 11 consolidado ou do Enunciado n. 198 do TST, com força para
contrastar a Carta Magna.
Por outro lado, na hipótese, inexiste em favor do empregador inadimplente a figura do ato jurídico
perfeito ou do direito adquirido. Simplesmente nada existe, inclusive face à nulidade plena do ato ofensivo
ao art. 9º da Consolidação das Leis do Trabalho.
Ademais, segundo a doutrina e a jurisprudência, o mandamento constitucional não encontra
obstáculo à sua incidência nos institutos da coisa julgada, do ato jurídico perfeito e do direito adquirido.
A garantia desses institutos, insculpida no art. 5º, XXXVI, da Carta Magna, só existe em face da
lei.'' (grifos nossos)
Invoca, ainda, em seu socorro, substancioso acórdão da lavra do Ministro Moreira Alves, que
levou o número Ac. STF-RE-90.391-SP-TP, DJU de 19.11.79.
Numa segunda corrente, na qual se insere o eminente Professor Amauri Mascaro Nascimento13,
houve uma ``ampliação do direito'', ficando o art. 11 da CLT, derrogado quanto ao prazo de 2 anos, que
passou para 5.
Para ele, a nova lei é irretroativa, porém, de efeito imediato!
E com relação à prescrição, especificamente, os novos prazos se resolvem com a verificação da
data do ajuizamento da ação trabalhista.
Assim, se a ação houver sido proposta antes da promulgação da nova lei, não é mais possível a
reabertura do prazo decorrido, pela própria propositura da ação.
Se, porém, a ação foi proposta depois, aplicam-se os novos prazos prescricionais.
Justifica seu posicionamento alegando que ``o autor é favorecido porque o ato jurídico - no caso,
o prazo prescricional - não se encontrava ainda exercido, perfeito ou acabado.''
É o ``efeito imediato'' das normas definidoras de direito e garantias fundamentais, previsto no
artigo 5º, LXXVII, § 1º, da CF de 1988.
Excetua o Mestre os casos de coisa julgada e ato jurídico perfeito.
Defendendo essa mesma corrente de pensamento, em recente trabalho publicado na Revista LTr
de outubro/89, o Juiz paranaense João Oreste Dalazen14, reportando-se aos conflitos que envolvem
trabalhadores urbanos, aventa 5 hipóteses diferentes, apresentando as respectivas propostas de solução
de cada caso, verbis:
``1º) contratos novos (celebrados a partir de 5.10.88): é de cinco anos o prazo prescricional para
a ação enquanto subsistente o contrato de emprego, contado da ciência da lesão a direito subjetivo; em
caso de extinção do contrato, o termo final do prazo é de dois anos após: até então, pode -se vindicar a
reparação de atos lesivos do qüinqüênio anterior;
2º) contratos de trabalho vigentes em 5.10.88: a nova prescrição qüinqüenal tem incidência
imediata, de conformidade com o item anterior; a nova norma constitucional relativa à prescrição será:
- retroativa quanto ao prazo ainda não consumado em 5.10.88, que é apanhado em seu curso
pela Constituição Federal e protraído até perfazer cinco anos, computado o lapso de tempo já escoado
até então;
- irretroativa quanto ao prazo definitivamente consumado em 5.10.88, em respeito ao direito
adquirido do empregador, salvo se em juízo a prescrição não for alegada;
3º) contratos extintos antes e ação proposta a partir de 5.10.88: a nova prescrição qüinqüenal
deve ter pronta aplicação, observado como termo final o biênio subseqüente à extinção do contrato,
preservando-se em todo o caso o direito adquirido do empregador concernente ao prazo prescricional já
exaurido inteiramente à luz da lei antiga quando veio a lume a nova Carta Magna, isto é, a menos que
não seja argüida, a prescrição jamais poderá retroagir antes de 5.10.86;
13 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. ``Direito do Trabalho na Constituição de 1988'', São Paulo, Saraiva,
1989, págs. 215-217.
14 DALAZEN, João Oreste. ``A nova prescrição das ações trabalhistas'', in Rev. LTr 53-10/1147.

4º) contratos extintos e processos pendentes, em 5.10.88: não incide a nova prescrição
qüinqüenal visto que tal importaria infringência a direito adquirido do empregador decorrente de
prescrição parcial já consumada ao tempo da lei velha;
5º) contratos extintos e processos já julgados em 5.10.88: prestações não postuladas e/ou não
acolhidas por sentença transitada em julgado, anteriores ao biênio, não podem ser acolhidas em outra
ação movida pelo empregado face ao direito adquirido do empregador e eventual coisa julgada material
de que se reveste a sentença primitiva que declara a prescrição''. (grifos do autor)
Na terceira corrente, na qual se inserem os Ilustres Professores desta Casa, Cássio de Mesquita
Barros Júnior e Orís de Oliveira; este últ imo15, invocando a lição de Câmara Leal, entende que em nosso
Direito deve prevalecer a doutrina da irretroatividade relativa da lei, negando-se-lhe retroatividade
somente quando esta vier a ofender um direito adquirido, um ato jurídico perfeito ou a coisa julgada.
E conclui:
``(...) não há dúvida que as leis que regem a prescrição são retroativas em relação às
prescrições não consumadas e irretroativas em relação às prescrições já consumadas.'' (grifos nossos)
Em recente conferência proferida no I Congresso Brasileiro de Direito Processual do Trabalho,
em 27 e 28 de julho do corrente ano, em São Paulo e reproduzida na Revista LTr de setembro de 1989, o
Professor Cássio de Mesquita Barros Júnior 16, partilhando da mesma tese, assim se expressou sobre a
matéria, verbis:
``(...) Cogita-se da retroatividade ou irretroatividade da lei reguladora da prescrição. Voltando às
lições do ilustre professor desta Casa, Câmara Leal, duas correntes se opõem: a francesa que consagra a
irretroatividade e a germânica que proclama a retroatividade. Nosso Código Civil não tem preceito
especial sobre a matéria. Com isso o assunto deve ser regulado pelo critério geral da Lei de Introdução ao
Código Civil que aceitou a doutrina da irretroatividade relativa da lei, negando-lhe a retroatividade
somente quando venha a ofender direitos adquiridos, ato jurídico perfeito ou coisa julgada.''
E conclui o aludido Mestre:
``Assim, não há dúvida que as leis que regem a prescrição são retroativas em relação às
prescrições não consumadas e irretroativas em relação às já consumadas.'' (grifos nossos)
No mesmo sentido, o Prof. Gelson de Azevedo17 conclui seu artigo a respeito do assunto,
defendendo a ``retroatividade relativa'', verbis:
``Resumindo e finalizando: o novo prazo prescricional da ação trabalhista, previsto no art. 7º, inc.
XXIX, alínea a, da Constituição Federal alongará (para 5 anos) o prazo (de 2 anos) que ainda não tenha
fluído por inteiro, na data do novo texto constitucional; já o prazo (de 2 anos) que tenha transcorrido por
inteiro antes do advento da nova Carta não sofrerá (sic) qualquer alteração. Sempre, em qualquer das
hipóteses referidas a contagem do prazo será feita a partir da data da lesão (de que tenha o lesado
conhecimento) para a frente, e não da data do ajuizamento da ação para trás.''
Em abono da mesma tese, ainda, se posiciona o Prof. Alaor Stauf Rezende18, apenas
ressaltando que não se trata de aplicação retroativa da prescrição, mas de aplicação imediata.
São suas conclusões, verbis:
``(...)
b) a prescrição tem natureza processual e, portanto, o dispositivo constitucional que ampliou o
prazo prescricional é de aplicação imediata;
c) aplicação imediata não se confunde com aplicação retroativa e, desta forma, as pretensões
que já podiam ser resistidas legitimamente pela argüição de prescrição não podem ser reavivadas;
d) a norma constitucional somente poderá ser aplicada em sua inteireza em 5 de outubro de
1991 (3 anos, que somados ao biênio do art. 11 da CLT, implicam em prazo prescricional de 5 anos);(...)''
(grifos no ssos)
Finalmente, o eminente jurista Arnaldo Süssekind19, examinando a matéria em trabalho
apresentado no Painel do Primeiro Congresso de Direito Processual do Trabalho já referido, cujo texto foi

15 OLIVEIRA, Orís de. ``A Prescrição no Direito do Trabalho Brasileiro'', in Rev. LTr 53-2/176.
16 BARROS JR., Cássio de Mesquita. ``Prescrição'', in Rev. LTr 53-9/1034.
17 AZEVEDO, Gelson de. ``O novo prazo de prescrição das ações trabalhistas'', in Rev. LTr 52-11/1375.
18 REZENDE, Alaor Stauf. ``A prescrição de créditos trabalhistas na Constituição de 1988'', in Rev. LTr
53-2/170.

reproduzido na íntegra na Revista LTr de setembro/89, assim, conclui seu pensamento sobre a aplicação
da prescrição nova, em face do direito intertemporal, verbis:
``17. Conclua-se, portanto que, se o prazo estava em curso quando da vigência da Constituição,
a prescrição passou a ser qüinqüenal, integrando-se nesse lapso o tempo fluído na vigência do art. 11 da
CLT. Tratando-se, porém, de contrato de trabalho anteriormente extinto, a partir dessa extinção, contarse-
á a prescrição bienal estatuída na CLT e, na hipótese, repetida na Lei Maior.''
II. A ISONOMIA ENUNCIADA NO ``CAPUT'' DO ART. 5º, DA CF DE 1988 E AS DIFERENCIAÇÕES
IMPOSTAS PELO INC. XXIX, ALÍNEAS ``A'' E ``B'' E PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 7º DA MAGNA
CARTA
Inegavelmente, há sensível contradição entre os dois preceitos retro-enunciados, constantes da
CF de 1988, visto que os trabalhadores urbanos não conseguiram o que queriam, os rurícolas tiveram
seus privilégios diminuídos e os domésticos foram profundamente discriminados.
Essa heteronomia de tratamento, por outro lado, está longe de ter conseguido tratar
``desigualmente os desiguais'' de modo a fazer-lhes justiça plena.
Assim, para efeitos meramente didáticos, nos limitaremos a tratar de cada um dos casos, no
ponto em que houveram mudanças:
1) QUANTO AOS TRABALHADORES URBANOS
1.1. Direito Anterior
A questão era tratada, a nível ordinário, na CLT, genericamente no seu art. 11, não havendo
dificuldade nenhuma na sua aplicação, conforme, aliás, já referido anteriormente neste trabalho.
1.2. Direito Atual
Houve, efetivamente, algum avanço a nível social, na medida em que se ampliou o prazo
prescricional de dois para cinco anos.
Do ponto de vista meramente jurídico, a forma de aplicação do instituto da prescrição, se bem
que hajam correntes divergentes entre si, quanto aos princípios básicos permanece inalterada.
Os prazos prescricionais, sim, foram dilatados, de dois para cinco anos, contados da data do
conhecimento da lesão, havendo, no entanto, o constituinte elevado o instituto a nível constitucional e
mantido o prazo de dois anos da ruptura do contrato para a propositura da ação, nesse aspecto se
assemelhando ao direito anterior.
No mais a matéria já foi exaustivamente tratada neste trabalho.
2) QUANTO AOS TRABALHADORES RURAIS
2.1. Direito Anterior
No direito anterior a prescrição relativa às ações ajuizáveis pelos rurícolas era regulada pelo art.
10, da Lei n. 5.889/73, que assegurava-lhes a imprescritibilidade de direitos no curso do contrato de
trabalho, limitada a 2 anos contados da sua ruptura, sem qualquer exigência de prestação de contas
intermediária ou outra formalidade.
2.2. Direito Atual
O constituinte pátrio, visando dar uma suposta isonomia de tratamento entre os trabalhadores
urbanos e rurais, ex vi do caput do art. 7º da Carta Magna de 5.10.88, acabou por restringir, nesse
particular, o direito então posto aos últimos, que consagrava a imprescritibilidade irrestrita dos seus
direitos e que agora, em face do disposto na alínea b, do inc. XXIX, do artigo supra c/c art. 233 e §§ 1º, 2º
e 3º, todos da CF de 1988, representam inegável retrocesso.
Nesse sentido, aliás, se posicionou o articulista José Tôrres das Neves (op. cit., LTr 53-8/930/1),
verbis:
``Sofreu retrocesso em relação à disciplinação anterior do art. 10 da Lei n. 5.889, de 28.6.73. O
retrocesso decorre do art. 233 e §§ 1º, 2º e 3º, que asseguram ao empregador rural, de cinco em cinco
anos, comprovar o cumprimento das suas obrigações trabalhistas. Ao mesmo tempo, o trabalhador só
poderá reclamar parcelas anteriores aos últimos cinco anos. A legislação anterior não continha tal
restrição e nem previa a comprovação de cumprimento das obrigações trabalhistas, no curso da relação
empregatícia. Está aberta porta larga para o exercício da coação e da fraude por parte dos empregadores
inadimplentes.(...)''

19 SÜSSEKIND, Arnaldo. ``Prescrição'', in Rev. LTr 53-9/1019.

O Professor Orís de Oliveira19a, em contundente estudo publicado pela Revista LTr de
fevereiro/89, também entende que a obrigação da prestação de contas a cada 5 anos, criada pelo
constituinte, favoreceu o empregador.
Por seu turno, muito se tem discutido sobre a natureza jurídica da homologação dessa prestação
de contas feita perante o Juiz do Trabalho.
Alguns entendem ser mero ato de jurisdição voluntária e que portanto não faria coisa julgada
stricto sensu. Outros entendem que uma vez homologada a prestação de contas, não se pode mais
discutir tais verbas em ação futura.
Neste último sentido se posicionou o Professor Amauri Mascaro Nascimento20, verbis:
``(...)
Embora ressalvada a hipótese de uma reclamação a qualquer tempo, os créditos já
comprovados em juízo não serão mais objeto de ação, porque sobre eles recairão os efeitos da
decadência.(...)'' (grifos nossos)
Por seu lado, o conhecido jurista Eduardo Gabriel Saad21, assim se expressa sobre o assunto,
verbis:
``O que for objeto dessa sentença - depois de passada em julgado, é óbvio - não poderá ser
repetido posteriormente em outra ação.'' (grifos nossos)
Entende, ainda, o mencionado Mestre, que ``é defeso ao empregador comprovar o cumprimento
das obrigações relativas aos últimos cinco anos da prestação de serviços'', o que redundaria a um prazo
prescricional efetivo de 5 anos, como o urbano, que acrescido de 2 anos da ruptura do contrato para o
ajuizamento da competente ação, chegaria a 7 anos.
O Professor Orís (op.cit., pág. 181), coloca três hipóteses diferentes que podem ocorrer na
prestação de contas:
A primeira, se o empregado e seu representante, concordarem com a mesma, o ato
homologatório será de jurisdição voluntária e não terá efeito de coisa julgada e sim de procedimento.
Numa segunda, contestada a prestação de contas, o fato de surgir o contraditório transforma a
jurisdição voluntária em contenciosa e a sentença que daí advier terá efeito de coisa julgada.
Numa terceira hipótese, havendo discordância apenas de parte da prestação de contas, haverá
um misto das duas hipóteses anteriores, i.e., haverá homologação da parte concorde e decisão da
discorde, de modo que os efeitos de uma e de outra serão os pecualiares ao procedimento em jurisdição
voluntária e o da jurisdição contenciosa.
Assim, numa rápida análise do novo texto constitucional, concernente ao rurícola, temos que
verdadeiramente, a pretexto de equipará-lo ao trabalhador urbano, no que tange ao instituto da
prescrição, houve retrocesso tendo os mesmos sido prejudicados, s.m.j.!
3) QUANTO AOS TRABALHADORES DOMÉSTICOS
3.1. Direito anterior
Os primórdios ou os primeiros ensaios de proteção ao trabalho doméstico em nosso país
remontam a 1941, quando o Dec.-lei n. 3.078, de 27.1.41, passou a dispor sobre a locação de
empregados em serviços domésticos.
No entanto, a execução de tal texto de lei, jamais chegou a ser implementada, porquanto, por
disposição sua expressa, dependia de regulamentação que o Executivo jamais editou.
Morreu na praia, já em 1943, quando a 1º de maio daquele ano, o art. 7º, alínea a da CLT,
expressamente excluiu essa laboriosa classe do seu raio de incidência.
Assim, ficou o trabalho doméstico relegado à regulação do Código Civil Brasileiro, mais
especificamente pela parte que trata da locação de serviços.
Apenas com o advento da Lei n. 5.859, de 11.12.72, regulamentada pelo Decreto n. 71.885, de
9.3.73 é que o doméstico passou a ter, ainda que timidamente, a alguma proteção especial, muito embora
mais voltada para a parte previdenciária.

19a OLIVEIRA, Orís de. (op.cit., pág. 178).
20 NASCIMENTO, Amauri Mascaro, (op.cit.).
21 SAAD, Eduardo Gabriel. ``Constituição e Direito do Trabalho'', 1ª ed., São Paulo, LTr , 1989.

Assim, autorizou os empregados domésticos a se inscreverem na Previdência Social, limitando,
no entanto, sua contribuição ao teto máximo de 3 salários mínimos regionais. De novo mesmo somente
lhes conferiu direito às férias de 20 dias, na forma que vigia então na CLT.
No mais, nada disciplinou, mormente acerca da aplicação do instituto da prescrição, que nos
interessa mais de perto neste estudo.
Assim, não se lhes aplicando, expressamente a regulação especial da CLT, passou-se a indagar
se a Justiça do Trabalho seria competente para conhecer e julgar as ações que tivessem por objeto
rel ações de trabalho entre domésticos e seus patrões.
Alguns, como Eduardo Gabriel Saad, defendiam de início que a competência era da Justiça
Comum.
Outros, que por se tratar de conflito entre empregado e empregador, a competência era da
Justiça do Trabalho.
Finalmente, parece ter prevalecido esta última corrente e ultimamente alguns Tribunais
Trabalhistas vinham concedendo aos domésticos, analogicamente, férias proporcionais e, em
contrapartida, acolhendo a argüição da prescrição bienal com base no art. 11 da CLT.
3.2. Direito atual
Novamente, de forma tímida, o constituinte estendeu aos trabalhadores domésticos apenas
alguns dos direitos conquistados pelos demais trabalhadores, sejam eles urbanos ou rurais, tendo-os
enumerado no parágrafo único do artigo 7º, da CF de 1988.
Por não contrariar a lei anterior (5.859/72) o novo texto constitucional, foi por este recebido, pela
teoria da recepção preconizada por Kelsen.
Assim, subsistem a nosso ver as férias de 20 dias, apenas acrescidas de 1/3, o limite de 3
salários mínimos como teto para contribuição à Previdência Social, podendo o legislador ordinário,
contudo, vir a equiparar os domésticos aos demais trabalhadores futuramente.
No que concerne à competência para julgar os processos oriundos de contrato de trabalho
doméstico, cremos não haver mais nenhuma dúvida em face do alargamento da competência da Justiça
do Trabalho pelo constituinte, no art. 114 da Carta Magna.
Porém, no que diz respeito à prescrição dos direitos trabalhistas dos empregados domésticos,
novamente o legislador (agora o constituinte) não se definiu, deixando no mundo jurídico a incerteza e,
conseqüentemente, margem para o surgimento ou ressurgimento de várias correntes.
Dentre elas, destacamos uma primeira, defendida por Arnaldo Süssekind22, que entende deva
ser aplicada a prescrição qüinqüenal do inc. XXIX, do art. 7º da Lei Maior, a despeito de não ter sido
expressamente elencada sua extensão aos domésticos no parágrafo único do mesmo artigo, pelo
constituinte.
Defende seu ponto de vista com veemência, fazendo correlação com seu entendimento anterior
da aplicabilidade do art. 11 da CLT ao doméstico, in verbis:
``V - Prescrição de reclamação trabalhista de empregado doméstico:
33. A prescrição não é direito social; é perda do direito de ação por inércia do titular do
questionado direito. Se não deveria figurar na Lei Maior, certo é que afronta a boa técnica legislativa a
inserção de regras sobre prescrição no elenco dos direitos sociais consubstanciados no art. 7º. Mas lá
está no inc. XXIX.
34. Essa circunstância, todavia, não deve afastar a aplicação do disposto no referido inciso às
relações de trabalho doméstico.
35. O parágrafo único do art. 7º da Carta Magna assegurou `à categoria dos trabalhadores
domésticos os direitos previstos nos incs. IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua
integração à previdência social'.
Não tratou do inc. XXIX referente à prescrição dos `créditos resultantes das relações de
trabalho.'
E não teria de fazê-lo porque o certo é que versasse a matéria em artigo próprio, limitando-se o
art. 7º a relacionar os direitos sociais, sem cogitar da prescrição do direito de ação.''
E conclui:

``36. Isto explica a razão pela qual ao enumerar os direitos sociais aplicáveis aos trabalhadores
domésticos, o parágr afo único do art. 7º não mencionou o inciso sobre a prescrição. Este substitui o art.
22 SÜSSEKIND, Arnaldo (op. cit., LTr 53-9/1022).

11 da CLT, que se aplica aos domésticos, devendo suas regras ser aplicadas sempre que a ação judicial
concernir a direitos oriundos das relações de trabalho.'' (grifos nossos)
Numa segunda corrente está o Professor Cássio de Mesquita Barros Júnior (op.cit., pág. 1.036),
que após concordar em parte com o Ministro Süssekind, quanto à aplicação da prescrição constitucional
aos domésticos, questiona se se deve antes de mais nada, perquirir se o trabalhador em questão trabalha
no meio urbano ou no rural, visto que no seu entender, o mesmo inc. XXIX do art. 7º, dá dois tratamentos
diferentes a cada um dos dois grupos acima, no que concerne à prescrição.
Em Conferência dada no I Congresso Brasileiro de Direito Processual do Trabalho, assim se
expressou sobre a matéria, verbis:
``O Ministro Arnaldo Süssekind sustenta, como tiveram todos a oportunidade de ouvir, que a
prescrição do doméstico é a mesma prevista na Constituição em vigo r. Como a Constituição estabelece
dois regimes de prescrição, um para o trabalhador urbano e outro para o trabalhador rural, se há de
decidir se aludidos regimes se aplicarão conforme se trate de doméstico que trabalhe em propriedade
rural ou prédio rústico, ou doméstico de trabalhe na cidade.''
Uma terceira corrente, defendida por Antonio Lamarca23, entende que tendo em vista o art. 2º do
regulamento da lei do doméstico e da ausência de disposição expressa na nova Constituição, se aplica ao
empregado doméstico a prescrição qüinqüenal do art. 178, § 10, inc. V, do Código Civil Brasileiro.
No mesmo sentido é o entendimento do eminente Eduardo Gabriel Saad (op. cit., pág. 176).
Por último, um quarto e interessante entendimento vem esposado pelo Professor Carlos Moreira
de Luca24, onde justifica seu entendimento segundo o qual a prescrição do doméstico continua a ser
bienal, não por aplicação analógica do art. 11 consolidado, mas sim com base no Dec.-lei n. 1.237, de
2.5.39, que a par de regular a Justiça do Trabalho, em seu art. 101 cuidou da prescrição, fixando em 2
anos o lapso prescricional para qualquer reclamação perante a Justiça do Trabalho, desde que não haja
disposição especial em contrário.
São suas palavras, textualmente:
``A solução, parece, está em antigo texto expresso, não revogado pela legislação posterior.
Efetivamente o Dec.-lei n. 1237, de 2.5.39, veio regular a Justiça do Trabalho, dando-lhe feição (que até
então não tinha) do organismo judiciário autônomo. Em seu art. 1º estabeleceu que `os conflitos, oriundos
das relações entre empregadores e empregados, reguladas na legislação social, serão dirimidos pela
Justiça do Trabalho.' E o art. 101 cuidou da prescrição, assim: `Não havendo disposição especial em
contrário prescreve em dois anos qualquer reclamação perante a Justiça do Trabalho.' '' (grifos nossos)
Mais adiante procura demonstrar que revogação dos vetustos dispositivos legais não houve e
conclui, verbis:
``Revogação expressa, pela CLT, das normas do Dec.-lei n. 1.237 não ocorreu. Ela não regulou
inteiramente a matéria de prescrição, pois como dito deixou de fora a disciplina da prescrição quanto a
outros direitos trabalhistas que não os por ela acolhidos. E suas disposições, por fim não são
incompatíveis com as do Dec.-lei n. 1.237, em matéria de prescrição, pois cuidou do tema sob outro
enfoque, mantendo porém o mesmo prazo de dois anos.
A conclusão a que se chega é que a prescrição para o exercício dos direitos assegurados aos
empregados domésticos é de dois anos, conforme aliás o entendimento da jurisprudência majoritária
havia já consagrado, referentemente a todos os direitos trabalhistas não consolidados.'' (grifos nossos)
Pessoalmente, partilhamos da primeira corrente, acrescendo, apenas, quanto às ponderações da
segunda, que se nos afigura que o trabalho doméstico se amolde mais ao tipo do trabalho urbano, daí por
que seria aplicável a prescrição qüinqüenal do art. 7º, inc. XXIX, alínea a, da Lei Maior.
III - FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO
Inegavelmente a nova Constituição Federal manteve expressamente o Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço, criado pela Lei n. 5.107, de 13 de setembro de 1967 incólume.
Por conseguinte, continuam os empregadores obrigados a depositar na conta vinculada do
empregado optante pelo sistema, os 8% sobre a sua remuneração mensal, procedendo de igual forma,
relativamente aos não-optantes, com a diferença de que a conta será individualizada. Sua extensão aos
rurícolas, a nosso ver, depende, ainda, de regulamentação, visto que a lei do FGTS, como posta, fala

23 LAMARCA, Antonio. Citado pelo Prof. Cássio Mesquita Barros em seu artigo ``Prescrição'', in Rev. LTr
53-9/1036.
24 DE LUCA, Carlos Moreira. ``O prazo de prescrição dos direitos assegurados aos empregados
domésticos'', in Rev. LTr 53-1/81.

expressamente em trabalhadores urbanos. Inobstante, a Caixa Econômica Federal, gestora do fundo, já
baixou portaria regulando a forma de recolhimento para os empregadores rurais!
Como essa parte não diz muito respeito ao presente estudo, vamos nos permitir prendermos
apenas à prescrição no fundo de garantia. Teria ela sido alterada pela nova Carta Magna? Continua
trintenária, como sustentavam alguns, ou passou a qüinqüenal na forma do art. 7º, XXIX?
Primeiramente, há que se fazer distinção entre quem é o titular da ação que visa a cobrança dos
depósitos para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço: se o empregado ou se o IAPAS, como
substituto processual do gestor do fundo.
Se se tratar do primeiro - empregado - e estando o FGTS elencado entre os direitos consagrados
no art. 7º da CF de 1988, parece-nos à primeira vista que deva ser observada a prescrição prevista no
inc. XXIX do mesmo dispositivo legal.
Porém, se se tratar de cobrança de depósitos por quem exerce ação fiscalizadora do fundo -
IAPAS - a prescrição, nos parece, s.m.j, deva ser a trintenária, ex vi da Lei n. 6.830/80, que em seu art. 2º
esclareceu:
``§ 9º - O prazo para a cobrança das contribuições previdenciárias continua a ser o estabelecido
no art. 144 da Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1980.''
Como a segunda hipótese pende para o campo do Direito Tributário ou Previdenciário, fugindo à
proposta deste trabalho, vamos nos fixar na primeira.
Nesse sentido, se posiciona o Ministro Arnaldo Süssekind (op. cit., pág. 1.021), in verbis:
``(...) Ora, se o FGTS constitui direito do trabalhador referido no elenco do art. 7º da Carta
Magna, temos como induvidoso que a prescrição da ação intentada por empregado, a respeito dessa
instituição jurídica, está sob o comando do disposto no inc. XXIX do me smo artigo. Aliás a incidência das
regas estatuídas nesse inciso é mais ampla do que a do revogado art. 11 da CLT.''
Por último há que se fazer distinção, quanto ao recolhimento do fundo de garantia, para efeito da
incidência da prescrição em ação movida por empregado contra seu empregador inadimplente, entre os
valores devidos e incidentes sobre salário e adicionais pagos oportunamente e aqueles sonegados e
somente reconhecidos em ação judicial.
Fazemos essa distinção, primeiro porque consoante entendimento doutrinário dominante, a
prescrição somente começa a fluir da ciência do ato lesivo.
Em assim sendo, relativamente às parcelas salariais pagas nas respectivas épocas próprias,
presume o empregado que seu empregador esteja cumprindo com a lei e que os órgãos incumbidos da
fiscalização estejam cumprindo seu papel, somente vindo a tomar conhecimento de eventuais falhas nos
recolhimentos devidos, quando do saque do fundo, por qualquer dos motivos previstos em lei, não se
podendo alegar incúria ou desinteresse do empregado. Aqui, no nosso entender, cabe a prescrição
trintenária consagrada no Enunciado TST 95.
Por outro lado, se o pleito se cingir à incidência do FGTS sobre parcelas sonegadas durante o
contrato de trabalho e reconhecidas em juízo, tendo havido argüição de prescrição, as parcelas relativas à
verba fundiária hão que se limitar ao principal imprescrito, segundo o princípio consagrado no nosso
Direito, segundo o qual o acessório segue o principal. Tal exegese, aliás, está consagrada no Enunciado
n. 206 do TST, com a necessária alteração nele introduzida pelo novo texto constitucional!
Aqui, sim, tem aplicação plena a tese defendida pelo eminente Ministro Süssekind,
retrotranscrita.
Finalmente, com relação à prescrição para a anulação da opção pelo sistema do fundo de
garantia do tempo de serviço, o prazo continua o mesmo, de um ano, regulado pela lei ordinária recebida
pela nova Constituição.
CONCLUSÕES
O instituto da prescrição tem seus alicerces no dever-poder do Estado de produzir regras que
visem o estabelecimento do equilíbrio e da paz social, com a certeza nas relações jurídicas.
A prescrição, conceitualmente falando, é o direito que alguém adquire, em face da inércia do
titular de uma pretensão resistida, por um período de tempo fixado em lei, de legitimamente se opor à
afirmação do direito.
A prescrição, no processo do trabalho, não pode ser conhecida e/ou declarada senão por
expressa provocação da parte a quem interessa.
O impulso ex officio do processo trabalhista não dispensa o autor de proceder às diligências
necessárias ao andamento do feito, nem tampouco sua fiscalização, sendo de se admitir a prescrição
intercorrente na Justiça do Trabalho, à exceção das que tiverem como fato gerador as causas
impedientes ou suspensivas.
A argüição de prescrição contra a afirmação de direito substancial há que ser feita na fase de
conhecimento, preferencialmente com a defesa, pelo princípio da concentração (CLT, art. 845), sendo
admissível a qualquer momento, na instância ordinária. Na fase executória a argüição limita-se à
prescrição intercorrente.
Com relação à nova lei sua aplicação é tão-somente imediata, projetando seus efeitos para o
futuro tendo como conseqüência imediata a suspensão do termo prescricional das parcelas ou lesões
verificadas a partir de 5 de outubro de 1986, porque não implementado na lei velha.
Os rurícolas continuam com a mesma sistemática anterior de imprescritibilidade no curso do
contrato de trabalho, contando-se o prazo de 2 anos somente a partir de sua ruptura.
As verbas e parcelas abrangidas pela homologação judicial de que fala o art. 233 da CF de 1988,
não poderão ser rediscutidas em nova ação, antes ou depois da ruptura do contrato, ainda que ajuizada
dentro do biênio prescricional que se lhe seguir.
A imprescritibilidade, contudo, alcança a parte do contrato que não tenha sido objeto de
apreciação na forma acima.
O ato homologatório da prestação de contas, por ser de jurisdição voluntária, tem natureza
jurídica de procedimento e não faz coisa julgada.
Ao contrário, se contestada a prestação de contas em juízo, quer pelo rurícola quer por seu
Sindicato, o procedimento convola-se em ação ordinária e a decisão que vier a ser proferida tem natureza
jurídica de sentença judicial, fazendo coisa julgada.
No caso do empregado doméstico, a prescrição a ser aplicada é a mesma do trabalhador
urbano, constante do art. 7º, inc. XXIX, alínea a.
Relativamente ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, as ações tendentes a constranger o
empregador a depositar as verbas fundiárias incidentes sobre salários e adicionais pagos durante o
contrato de trabalho, continuam com prescrição trintenária, enquanto que naqueles feitos em que o fundo
de garantia é apenas incidental sobre parcelas sonegadas, o prazo prescricional há que ser o mesmo do
principal, quer se trate de trabalhador urbano (qüinqüenal), quer rurícola quando vier a ser regulamentado
para estes.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA
JULGAR LITÍGIOS ENTRE SERVIDORES
ESTATUTÁRIOS E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Sebastião Lemos Borges(*)
Em que pesem os claros e expressos termos do art. 114 da CF, no qual a competência da
Justiça Obreira para o exame e deslinde das controvérsias coletivas, em que figurem como parte entes da
Administração Direta, exsurja com nitidez, assistem-se infindáveis debates nos pretórios e na doutrina,
sobre o tem, lavrando-se grande discórdia.
Ociosa tal discussão bizantina.
Temos para nós que, na linha da abertura do texto matriz, o art. 114, representam os incs. VI e
VII do art. 37 da novel Carta Política, que asseguram, respectivamente, aos funcionários públicos o direito
à associação sindical e ao direito de greve, este último conforme definido em lei complementar, o mais
expressivo sintoma daquela competência, competência esta definida até para o exame das
circunstâncias, dos qualificativos do próprio movimento paredista, se abusivo ou não.
Por que? Ora, o que são a associação sindical e a greve senão fenômenos sociais que
precedem, poderíamos dizer, necessariamente, à atuação jurisdicional para a justa composição da lide,
segundo imagem carnelutiana? Não são infensos ao exame e conclusões da Justiça.
Saibam que a associação sindical nada mais retrata do que a polarização, encarnada na pessoa
jurídica, da persecução de interesses coletivos dos trabalhadores.
A greve é um movimento coletivo reivindicatório, movida pelo sindicato, traduzindo o poder de
barganha do trabalhador, no curso da negociação coletiva que, frustrada, desaguará em um dissídio
coletivo.
Observem que referidos dispositivos reproduzem a preocupação do legislador constituinte,
voltada à disciplina das relações jurídicas coletivas, no âmbito da prestação de serviços em benefício de
terceiros, seja relação de trabalho, seja relação de emprego.
Lembramos que o art. 114 fala em trabalhadores e empregadores, como que carreando para o
seu seio o universo das relações jurídicas em cujos pólos se posicionem o tomador e o prestador de
serviços.
Inadmitido que as relações entre funcionários públicos e a Administração Pública Direta não seja
qualificada como contrato de trabalho subordinado, certamente o será uma relação de trabalho, na esteira
da corrente anticontratualística, dos alemães, em cujo segmento se adequam as relações estatutárias.
Sobre o assunto, manifestou-se Délio Maranhão:
``... Na mesma linha de idéias, sustentam outros que essa relação resulta da simples inserção ou
da ocupação de fato do trabalhador na empresa. O empregado não mais contrata com o empregador:
torna-se membro de uma instituição''.
(Délio Maranhão, Instituições de Direito do Trabalho'', vol. 1, pág. 225).
Mozart Victor Russomano, em seu comentário à CLT, vol. I, 13ª ed., Forense, destaca que:
``É claro que a relação de trabalho não se confunde com a relação de emprego. O trabalhador
autônomo, o trabalhador eventual, o funcionário público etc. estão ligados à pessoa daquele em benefício
do qual o serviço é prestado por força de uma relação de trabalho, mas inexiste relação de emprego entre
eles''. (grifos nossos)
Disso a ninguém é lícito duvidar, eis que o contexto do art. 114 preceitua a competência da
Justiça do Trabalho para conciliar e julgar dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e
empregadores, abrangidos os entes da Administração Pública Direta.
Que o funcionário público é um trabalhador, é inafastável.
Mas o dispositivo utiliza o termo empregador, para denominar o outro pólo da relação jurídica.
O vocábulo gerou muita confusão entre os juristas.

(*) Sebastião Lemos Borges - Procurador do Trabalho da 15ª Região (PRT/Campinas).

Argüiu-se que o Estado não é empregador, como o disse o notável Professor Octavio Bueno
Magano, em conferência que fez durante o 2º Congresso de Direito Processual, patrocinado pela LTr, já
que a relação jurídica entre Servidores e Administração não é de natureza contratual. Concluindo pela
incompetência da Justiça do Trabalho para o exame das insatisfações entre funcionário público e o
Estado.
Na guarida de tão ilustre fala, não demorou que doutrinadores e juristas, até de grande
envergadura, excluíssem literalmente a Justiça do Trabalho das demandas em que figurassem funcionário
público e a administração.
Ora, desmistifiquemos o vocábulo empregador. Não é unívoco e nem equívoco. É análogo, no
sentido de que pode denominar outros fenômenos jurídicos e sociais.
Nada melhor do que a consulta ao dicionário Aurélio, que diz:
``que emprega, aquele, que emprega''.
Após discorrer sobre dezenas de sinônimos, conclui:
``aproveitar os serviços, as atividades de alguém, tanto no serviço público ou particular''.
É do conhecimento geral que a linguagem do legislador constituinte não foi um primor técnicojurídico
na definição semântica da ciência do direito.
Tudo faz crer que o termo utilizado o foi no sentido universal, como forma de abrigar todas as
relações jurídicas de trabalho, como forma, também, de se compatibilizar com o termo trabalhador.
Somos persuadidos a isso pela utilização do termo trabalhador, de conceituação genérica, que
se levado às últimas conseqüências técnicas, atrita com o vocábulo empregador.
É princípio elementar de hermenêutica jurídica que a interpretação do texto de lei não pode levar
a uma hipótese absurda.
Evidentemente, que não desejaria tal situação o legislador.
Depois, o contexto do próprio artigo desfaria essa ambigüidade.
Vejam que, inobstante o comando advindo da novel Carta Política, que reputamos, data venia,
claro, veio o Congresso Nacional, que, em última ratio, é integrado pelos constituintes de 1988, de editar a
Lei n. 8.112/90, cujas alíneas d e e, de seu art. 240, atribuem competência à Justiça Obreira para o
exame e deslinde das controvérisas coletivas e individuais.
É certo que, por força de ação direta de inconstitucionalidade, proposta pelo Exmo. Sr.
Procurador-Geral da República, em que concedida liminar pelo Pretório Excelso, acham-se suspensos a
alínea d e o vocábulo ``Coletivamente'' da alínea e. Contudo, o tema está sub judice.
É evidente que o dispositivo veio à luz para disciplinar aqueles dissídios em razão de
regulamentação do que preceitua o art. 114, verbis...
...e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho...
A nós nos pareceu despiciendo esse esforço legislativo, ante o insofismável desiderato do artigo
sob comento.
Lembramos que encontra-se em plena vigência a alínea e, expurgada do vocábulo
``coletivamente'', o que nos serve de alento, eis que na mais alta Corte há como um quê de fumus bonis
iuris de reconhecimento da competência da Justiça Laboral quando a irresignação se individualiza.
É um bom começo.
Ora, em sede de dissídio coletivo não se examinam somente cláusulas econômicas. Há as
sociais sem repercussão no erário público. Há, também a aferição dos qualificativos do movimento
paredista.
Estamos convencidos de certeza de que a ação direta de inconstitucionalidade deveria ter a
preocupação de preservar a incolumidade das vedações constitucionais, tocantemente às cláusulas
econômicas, somente, não estando sob o pálio da dúvida a questão da competência.
Se a greve é um direito, este direito não é refratário ao exame judicial quanto ao seu exercício,
sendo curial que essa apreciação pertine à esfera do poder normativo, somente conferido à Justiça do
Trabalho, que dirá sobre ser o movimento abusivo ou não.
Sim, porque, para exemplificar, se o sodalício, por seu Grupo Normativo decreta a greve abusiva,
com o conseqüente impagamento dos dias parados, eventualmente em demanda individual, pretensão do
jaez poderá ser rechaçada em razão do modelo normativo.
E por falar em greve, repelimos aqueles pronunciamentos ou decretos judiciais que arrematam
com a ilegalidade da greve de servidores públicos, eis que o inc. VII, do art. 37, da Carta Magna carece
de regulamentação, via lei complementar.
Causa-lhes repulsa a aplicação analógica da Lei n. 7.783/89 (Lei de Greve) àquela parede.
Na esteira de não poucos juristas, defendemos a tese da incidência desse diploma à greve de
servidores públicos.
A eficácia limitada das leis constitucionais não impedem que sua carga normativa desemboque
no segmento normativo de outro preceito, lembrado por analogia.
É a lição que nos chega da pena do eminente constitucionalista José Afonso da Silva.
``I - Todas as disposições de uma Constituição rígida são constitucionais, em virtude do
instrumento a que aderem.
II - Todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia jurídica e imediatamente aplicáveis
nos limites dessa eficácia'' (grifos nossos)
Para o ilustre professor as normas constitucionais podem ser consideradas em três dimensões:
``a) Normas Constitucionais de Eficácia plena e aplicabilidade imediata; b) Normas
Constitucionais de Eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrição; c) Normas
Constitucionais de Eficácia limitada ou reduzida, que compreendem dois grupos:
1 - Normas de Eficácia limitada, definidoras de princípio institutivo, que são aquelas que prevêem
esquemas genéricos de instituição de um órgão ou entidade, cuja estruturação definitiva o legislador
Constituinte deixou para a legislação ordinária;
2 - Normas de Eficácia limitada, definidoras de princípio programático, que são aquelas que
traçam esquemas de fins sociais, que devem ser cumpridas pelo Estado, mediante uma providência
normativa ou mes mo administrativo ulterior, ou de vínculo''. (Citados em Celso Ribeiro Bastos, ``Curso de
Direito Constitucional, 7ª ed., Saraiva).
Referindo-se às primeiras (item 1), a de princípio institutivo, comenta:
``As primeiras são aplicáveis, independentemente da lei prevista, enquanto possam...'' (grifos
nossos).
Reportando-se a uma e outras (itens 1 e 2), arremata:
``Podem ser aplicadas independentemente dessa lei, por serem dotadas de um mínimo de
eficácia, regendo até onde possam (por si sós ou coordenadas com outras normas constitucionais)
situações, comportamentos e atividades na esfera de alcance do princípio ou esquema que contém,
condicionando, assim, a atividade dos órgãos do Poder Público e criando situações jurídicas de
vantagens ou de vínculo...'' (grifos nossos)
A Lei n. 7.783/89 é o desaguadouro, é o canal para a materialização plena das virtualidades do
inc. VII, art. 37 da Carta Política.
É a perfeita adequação da irrefutável doutrina do festejado professor à contextura constitucional
do direito de greve ao servidor público.
Pouco importa que a própria Lei n. 7.783/89, no art. 160 exclua sua aplicação analógica.
Compulsando-se a Constituição Federal, no elenco das competências atribuídas às Justiças
Comuns e Especializadas constata-se que nenhuma delas foi brindada de forma tão inequívoca como o
foi a Justiça Obreira para o desate coletivo das relações de trabalho.
Decretar-se a incompetência da Justiça Obreira e remeter o feito à Justiça comum quer nos
parecer providência que não se conforma com a Lei Maior.
Temos ciência, através do Processo TRT-15ª Reg. n. 084/91-P, de decisão daquela justiça que
se absteve de exame da lide, nessas condições, eis que declarara-se incompetente, remetendo o feito a
uma das JCJ de Campinas.
Aliás, o art. 109, I, da CF exclui, expressamente, a Justiça Federal de atua nas causas sujeitas à
Justiça do Trabalho, não lhe delegando quaisquer poderes normativos.
Normas de Organização Judiciária do Estado não dispõem sobre competência normativa nessa
esfera.
Desnecessário qualquer esforço exegético, e nenhum trabalho de garimpo para se concluir pela
competência da Justiça Laboral, para levar ao desate de inconformismo veiculado em ação coletiva,
exatamente por se tratar de um conflito levado a cabo no segmento de uma relação de trabalho, dentro do
qual repetimos, acham-se inseridas as relações jurídicas entre servidor público e a Administração Pública,
à égide do regime único.
Valem a pena as palavras de André Rouast:
``as categorias jurídicas devem corresponder às realidades da vida econômica''.
(Apud Délio Maranhão, ''Instituições de Direito do Trabalho'', vol. I, pág. 269).
E a realidade está a demonstrar que o setor público detém a hegemonia dos movimentos
paredistas.
Insofismável, pois, a perfeita adequação da disciplina constitucional a esse evento de grande
repercussão social.
A nós nos parece que toda a celeuma decorre do impacto do novo, do advento de um universo
jurídico jamais sonhado anteriormente à edição do texto magno.
Pela manifestação de algumas obras jurídicas e, até, de algumas decisões isoladas, o
impedimento da criação de normas abstratas tocantemente às cláusulas econômicas, em virtude do
princípio da legalidade, tem levado algumas decisões, com alguma afoiteza, a sepultar no nascedouro o
próprio processo, não raro via decretação de incompetência, denunciando alguma confusão entre questão
processual, condição de ação, e mérito.
Enquanto tais discussões são elevadas à altura paroxística da abstração, conflitos sociais dos
mais graves, com sérias repercussões, atingem a segurança, a saúde e a própria vida dos integrantes da
comunidade.
Que o Judiciário Trabalhista de forma altaneira e com desassombro assuma essa competência
constitucional e passe ao exame e sancionamento desses movimentos, nem sempre conforme aos
ditames da lei e da justiça.



Revista do ministério público do trabalho, 2º sem, set. 1992. Disponível em . Acesso em 9.dez.2007.


Guilherme Mastrichi Basso
Procurador do Trabalho e Mestrando em Direito do Trabalho, pela USP.

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ITANHAÉM, MEU PARAÍSO

ITANHAÉM, MEU PARAÍSO
Um dia a gente aprende que aquilo que vale a pena não tem preço.

MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

SENTENÇA HISTÓRICA - Juiz Marcos Neves Fava, TITULAR DA 89ª VARA DE SÃO PAULO

Esta sentença ganhou fama entre os acadêmicos de direito. Desde o primeiro ano, recebi várias mensagens, com o seu conteúdo.

Notabilizou-se tanto em razão do estilo, limpo e objetivo, como pela sensatez do jurista.

Tornou-se clássica. Referência para outros julgados.

Há passagens memoráveis, que demonstram profundo conhecimento do ser humano.

O reproduzi-la uma vez mais, neste espaço especial, é forma de lembrar a todos nós que é possível, em um homem que tem o destino de tantos outros em suas mãos, coexistirem o amor à justiça e a obediência às leis, sem que se percam a sensibilidade e o amor à arte.


O homem pode perder-se quando, pensando ter tomado o poder, o poder o toma, e entende-se perfeito.
Pode perder-se quando muito tem, abandonando-se aos bajuladores.
Pode perder-se quando tudo abandona.
O homem pode perder-se, afinal, pelos sonhos, sem que aceite tornar à realidade.


Processo 0445.420.060.890.200-8"Porque é que, na maior parte das vezes, os homens na vida quotidiana dizem a verdade? Certamente, não porque um deus proibiu mentir. Mas sim, em primeiro lugar, porque é mais cômodo, pois a mentira exige invenção, dissimulação e memória. Por isso Swift diz: «Quem conta uma mentira raramente se apercebe do pesado fardo que toma sobre si; é que, para manter uma mentira, tem de inventar outras vinte». Em seguida, porque, em circunstâncias simples, é vantajoso dizer diretamente: quero isto, fiz aquilo, e outras coisas parecidas; portanto, porque a via da obrigação e da autoridade é mais segura que a do ardil. Se uma criança, porém, tiver sido educada em circunstâncias domésticas complicadas, então maneja a mentira com a mesma naturalidade e diz, involuntariamente, sempre aquilo que corresponde ao seu interesse; um sentido da verdade, uma repugnância ante a mentira em si, são-lhe completamente estranhos e inacessíveis, e, portanto, ela mente com toda a inocência". (Friedrich Nietzsche, in 'Humano, Demasiado Humano' )A. RelatórioJosé Neto da Silva, qualificado na inicial, alegando ter sido empregado da ré, sustenta que não viu corretamente quitados e pretende receber, lançando mão de seu direito constitucional de ação, os valores que decorrem de horas extras e reflexos.À causa atribuiu o valor de R$ 283.000,00.Citada, a ré não compareceu a Juízo, tornando-se revel.Foi ouvido o reclamante.Encerrada a instrução processual, dadas por infrutíferas as tentativas de conciliação.Assim relato, para decidir.B. FundamentosIJustiça gratuita.Concedo ao postulante os benefícios da justiça gratuita, nos termos do artigo 790, parágrafo terceiro, da C.L.T. (f. 14).IIHoras extraordinárias.Alega o reclamante que laborava das 0:00 às 24:00 horas, sem intervalo de refeição e sem qualquer folga, entre 2001 e 2005.Alertado por mim, em instrução, de que, à vista da experiência deste Juiz de mais de 11 anos de magistratura na área do trabalho, era pouco plausível, para dizer o mínimo, o trabalho continuado, sem dormir, nem comer, por mais de quatro anos, insistiu em reafirmar a jornada. Cedeu, apenas, para dizer que entre 12 e 13 horas, dormia um cochilo de 60 minutos.Em que pese a revelia da reclamada, pondero que a sentença judicial tem caráter e função públicos, não se prestando a ratificar absurdos.Mentirosa a alegação da inicial.Com efeito, ainda que laborasse, por exemplo, 20 horas por dia – carga já elevadíssima – mister que se alimentasse, no mínimo, uma vez por dia.Negar sono – uma hora por dia, nos mais de 4 anos da avença – e negar parada para qualquer intervalo – nunca gozou de folgas – é mentir, deslavadamente, em Juízo.E quem mente acintosamente, não tem limites para continuar inventado.A revelia não confirmaria que o reclamante trabalhava voando por sobre o telhado da empresa, como também não confirmaria que ele recepcionava extraterrestres, quando das visitas regulares dos marcianos à Terra.Não obstante a confissão da reclamada, por sua revelia, não vejo possibilidade de concessão dos títulos postulados.O processo não é um jogo de pega-pega, é instrumento de distribuição da justiça e de fixação dos parâmetros da cidadania e isto está acima do interesse privado de defesa do reclamado.Não pode o Judiciário reconhecer o impossível, sob pena de desrespeito à sociedade.Por estas razões, julgo improcedente a pretensão exordial.Mentir em Juízo é deslealdade processual, razão pela qual, com fundamento no artigo 18 do Código de Processo Civil, fixo pena de 1% do valor da causa, em favor da parte oposta.IIIC. DispositivoDo exposto, julgo improcedente a pretensão de José Neto da Silva contra Wide productions ltda, para absolver da instância o réu e condenar o reclamante por litigante de má-fé, na forma da fundamentação que este dispositivo integra sob todos os aspectos de direito, observando-se ainda:Custas.Serão suportadas , no importe de R$ 5.560,00 calculadas sobre o valor de R$ 283.000,00, de cujo recolhimento fica dispensada, na forma da lei..Providências finais.Junte-se aos autos.Registre-se.Cumpra-se.Ciente, o autor, na forma da súmula 197 do Tribunal Superior do Trabalho. Intime-se o réu.Nada mais.Marcos Neves FavaJUIZ DO TRABALHOTITULAR DA 89ª VARA DE SÃO PAULO